Como o próprio documento de lançamento da Década das Nações Unidas para o Envelhecimento Saudável (DNUES) indica, a iniciativa visa implementar “10 anos de colaboração combinada, catalítica e sustentada (…) que reunirá governos, a sociedade civil, agências internacionais, profissionais, a academia, a mídia e o setor privado para melhorar a vida das pessoas idosas, de suas famílias e de suas comunidades”. A iniciativa tem por base o Plano de Ação Internacional sobre o Envelhecimento, aprovada pela Segunda Assembleia sobre Envelhecimento, das Nações Unidas, realizada em Madrid, Espanha, entre 8 e 12 de abril de 2002 e está alinhada com o cronograma da Agenda 2030 das Nações Unidas sobre Desenvolvimento Sustentável e com os Objetivos de Desenvolvimento Sustentável.
O conceito de envelhecimento saudável está definido no mesmo documento como capacidade de “desenvolver e manter a habilidade funcional que permite o bem-estar na idade avançada”[1]. Tal capacidade tem três componentes essenciais “capacidade intrínseca de um indivíduo (isto é, a combinação de todas as capacidades físicas e mentais do indivíduo), pelo ambiente em que ele ou ela vive (compreendido no sentido mais amplo possível e incluindo os ambientes físico, social e político) e pelas interações entre eles”1.
Aumenta, a cada ano, em todo o mundo, o número de pessoas longevas. No Brasil, por exemplo, uma pessoa nascida no Brasil em 2018 tem expectativa de, em média, viver até os 76,3 anos, o que representa um aumento de três meses e 4 dias, em relação aos nascidos em 2017[2].
Em 2020, pela primeira vez na história, as pessoas com 60 anos ou mais ultrapassam, a nível mundial, o número de crianças abaixo de 5 anos. Em 2050, o número de pessoas acima de 60 anos corresponderá a mais do que o dobro do número de crianças abaixo de 5 anos. Este crescimento da população longeva irá acelerar cada vez mais, nas próximas décadas. Ao fim da Década do Envelhecimento Saudável (2021-2030), o número de pessoas com mais de 60 anos será 34% maior, passando de 1 para 1,4 bilhões. Em 2050, esse mesmo setor da população terá mais do que dobrado, chegando a 2,1 bilhões de pessoas.
O envelhecimento da população continuará afetando todos os aspectos da sociedade, incluindo “os mercados de trabalho e financeiro, a demanda por bens e serviços, como educação, moradia, saúde, cuidados a longo prazo, proteção social, transporte, informação e comunicação, e estruturas familiares e vínculos intergeracionais”1. Se as pessoas longevas tiverem boa saúde, elas podem e devem continuar participando, ativamente, da vida coletiva das famílias e comunidades; entretanto, se nesses anos adicionais, imperarem dinâmicas de saúde debilitada, degradação da qualidade de vida e geração de situações de dependência profunda, as consequências para as pessoas idosas e para a sociedade serão muito negativas. Os impactos do aumento da longevidade são complexos, até porque existem disparidades várias em termos de expectativas médias de vida, desde as diferenças entre pessoas de diversos níveis sociais e econômicos, até às diferenças entre homens e mulheres.
Como é assinalado no documento de lançamento, a DNUES “proporciona uma nova oportunidade de abordagem das relações de poder de gênero, das normas que influenciam a saúde e o bem-estar de mulheres e homens mais velhos e das associações interseccionais entre gênero e idade”. Apesar de, em média, a esperança de vida das mulheres ser superior à dos homens, as mulheres idosas são, frequentemente, mais pobres e têm menos economias que homens. “Por conta de uma vida inteira de discriminação, que afeta negativamente a igualdade de oportunidades para mulheres e o tratamento nos mercados de trabalho, a segurança de renda em uma idade avançada e o acesso aos benefícios previdenciários contributários são piores para mulheres idosas (…). Em muitos lugares, mulheres idosas também estão mais vulneráveis à pobreza e desvantagem…”1. Haverá, ainda, que referir a existência, em certos locais do mundo, de práticas culturais danosas (como a da “purificação de viúvas”), que afetam o envelhecimento saudável de algumas mulheres1. A isto haverá que acrescentar os comportamentos, ainda demasiado desaminados, de violência doméstica e feminicídio.
Princípios norteadores
Na tabela 1 reproduzem-se os princípios norteadores da DNUES, conforme explicitados no documento de lançamento.
Tabela 1. Princípios norteadores para a Década do Envelhecimento Saudável
Princípios | Explicitação |
Integrada e indivisível | Todas as partes interessadas participantes da implementação abordam todos os Objetivos de Desenvolvimento Sustentável de forma conjunta, não como uma lista de objetivos a partir da qual selecionam e escolhem. |
Inclusiva | Envolve todos os segmentos da sociedade, independente de idade, gênero, etnia, capacidade, localização ou outras categorias sociais. |
Parcerias com múltiplas partes interessadas | São mobilizadas parcerias com múltiplas partes interessadas para o compartilhamento de conhecimento, expertise, tecnologia e recursos. |
Universal | Envolve todos os países, independente do nível de renda e do status de desenvolvimento, em um trabalho abrangente pelo desenvolvimento sustentável adaptado a cada contexto e população, conforme necessário. |
Não deixa ninguém para trás | Aplicável a todas as pessoas, independente de quem sejam e onde estejam, tendo como alvo seus desafios e vulnerabilidade específicos. |
Equidade | Defende oportunidades iguais e justas para o aproveitamento dos determinantes e facilitadores do envelhecimento saudável, incluindo status social e econômico, idade, gênero, local de nascimento ou residência, status migratório e nível de capacidade. Às vezes, isso pode demandar uma atenção desigual a alguns grupos populacionais, de modo a garantir o maior benefício aos membros menos favorecidos, mais vulneráveis ou mais marginalizados da sociedade. |
Solidariedade intergeracional | Proporciona coesão e uma troca interativa entre gerações, apoiando a saúde e o bem-estar de todas as pessoas. |
Compromisso | Encoraja um trabalho de 10 anos e que adentre um prazo mais longo. |
Sem danos | Empenha os países na proteção do bem-estar de todas as partes interessadas e na minimização de qualquer dano previsível a outros grupos. |
Áreas de Ação e Ações a desenvolver em parceria
São 4 as grandes áreas de ação propostas para a DNUDS:
- mudar a forma como pensamos, sentimos e agimos com relação à idade e ao envelhecimento;
- garantir que comunidades promovam as capacidades das pessoas idosas;
- entregar serviços de cuidados integrados e de atenção primária à saúde centrados na pessoa e adequados à pessoa idosa;
- propiciar o acesso a cuidados de longo prazo às pessoas idosas que necessitem.
Relativamente a cada uma destas quatro áreas são definidas ações que deverão ser implementadas pelos diversos atores, em especial, Secretaria da OMS e outras agências das Nações Unidas, estados membros e parceiros nacionais e internacionais.
A Década do Envelhecimento Saudável será impossível de concretizar sem a parceria colaborativa multisetorial, voluntária, assumida e comprometida com múltiplas partes interessadas, “necessárias para a consecução de seu compromisso de promover uma mudança transformadora, ao mesmo tempo em que se constrói confiança por gerações ao otimizar as oportunidades de todos em prol do envelhecimento saudável”1. Está prevista a criação de uma plataforma para conectar e convocar as partes interessadas que promovem as quatro áreas de ação no país e, para isso, buscam informações e orientação. A plataforma permitirá o trabalho nas quatro áreas definidas:
- ouvindo as diversas vozes e permitindo o envolvimento com significado da pessoa idosa, de familiares, cuidadores, jovens e comunidades;
- estimulando a liderança e o desenvolvimento de capacidades para a tomada de ações adequadas e integradas por todos os setores;
- conectando várias partes interessadas ao redor do mundo para o compartilhamento e a aprendizagem a partir das experiências do outro; e fortalecendo dados, pesquisa e inovação visando a acelerar a implementação.
Publicado por: Mário Freitas, mentoria Qualitte Life Sênior
[1] Década do Envelhecimento Saudável 2020-2030. Organização Pan-Americana da Saúde OPASWBRAFLP, 2020. Consultada em https://www.who.int/docs/default-source/decade-of-healthy-ageing/final-decade-proposal/decade-proposal-final-apr2020-en.pdf , realizada em 01.01.2021.
[2]https://www.uol.com.br/vivabem/colunas/danta-senrra/2019/12/07/expectativa-de-vida-do-brasileiro-aumentou-o-que-isso-realmente-significa.htm
Fontes:
https://www.paho.org/pt/noticias/14-12-2020-assembleia-geral-da-onu-declara-2021-2030-como-decada-do-envelhecimento
Década do Envelhecimento Saudável 2021-2030, OPASWBRAFLP, 2020